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Lua nova

 


ÍNDICE
1. FESTA ..................................................................................................................................... 4
2. SUTURA ............................................................................................................................... 16
3. O FIM ................................................................................................................................... 26
5. TRAPAÇA .............................................................................................................................. 55
6. AMIGOS ............................................................................................................................... 62
7. REPETIÇÃO .......................................................................................................................... 71
8. ADRENALINA....................................................................................................................... 80
9. TRIÂNGULO......................................................................................................................... 89
10. A CAMPINA........................................................................................................................ 99
11. CULTO ............................................................................................................................... 111
12. INVASÃO .......................................................................................................................... 122
13. ASSASSINO ...................................................................................................................... 132
14. FAMÍLIA ............................................................................................................................ 142
15. PRESSÃO .......................................................................................................................... 150
16. PÁRIS ............................................................................................................................... 159
17. VISITANTE ....................................................................................................................... 168
18. O ENTERRO ..................................................................................................................... 178
19. CORRIDA .......................................................................................................................... 187
20. VOLTERRA ........................................................................................................................ 195
21. VEREDICTO ...................................................................................................................... 203
22. VÔO .................................................................................................................................. 213
23. A VERDADE ...................................................................................................................... 220
24. VOTAÇÃO ......................................................................................................................... 230
EPÍLOGO: PACTO................................................................................................................... 241


PREFÁCIO
Eu me sentia como se estivesse presa em um daqueles terríveis pesadelos, um onde você
precisa correr, correr até seus pulmões estourarem, mas você não pode fazer seu corpo se mover
rápido o suficiente. Minhas pernas se moviam devagar e mais devagar enquanto eu me esforçava
para abrir caminho pela indiferente multidão, mas os ponteiros na enorme torre do relógio não
reduziram a velocidade. Com implacável, insensível força, eles decididamente iam em direção ao
fim – o fim de tudo.
Mas isso não era sonho, e, ao contrário do pesadelo, eu não estava correndo pela minha
vida; Eu estava correndo para salvar algo infinitamente mais precioso. Minha própria vida já não
importava tanto.
Alice tinha dito que havia uma boa chance de morrermos aqui. Talvez o resultado fosse
diferente se ela não fosse apanhada pela ofuscante luz do sol, só eu podia correr por essa
iluminada, aglomerada praça.
E eu não podia correr rápido o suficiente.
Então não me importava que nós estivéssemos cercados de nossos inimigos
extraordinariamente poderosos. Assim que o relógio começou a soar a hora, vibrando abaixo das
solas de meus lentos pés, eu soube que estava muito atrasada – e eu me alegrei que alguma coisa
sanguinária estivesse me esperando pelos arredores. Se isto desse errado, eu perderia qualquer
vontade de viver.
O relógio soou de novo, e o sol se pôs bem no meio do céu.
1. FESTA
Eu tinha 99% de certeza de que estava sonhando.
As razões para eu estar tão certa disso eram que, em primeiro lugar, eu estava em pé em
um brilhante raio de luz solar – o tipo de sol intenso e ofuscante que nunca brilhava em minha
atual chuvosa cidade natal em Forks, Washington – e segundo, eu estava olhando para minha avó
Marie. Vovó tinha morrido seis anos atrás, então essa foi minha evidência concreta que comprovou
a teoria do sonho.
Vovó não tinha mudado muito, seu rosto parecia o mesmo que eu lembrava. A pele era
macia e tinha um aspecto murcho, se dobrava em mil rugas finas debaixo das quais se agarrava
suavemente o osso. Como um pêssego seco, mas aureolada por um espesso bolo de cabelos
brancos de fisionomia similar a uma nuvem.
Nossos lábios – os dela franzidos em uma grande quantidade de rugas – estendidos num
mesmo meio sorriso de surpresa ao mesmo tempo. Aparentemente, ela não esperava me ver
também.
Eu estava a ponto de fazer uma pergunta; Eu tinha tantas – O que ela estava fazendo aqui
em meu sonho? Aonde ela esteve nos últimos seis anos? Vovô estava bem? Eles haviam se
encontrado onde quer que eles estivessem? – mas ela abriu a boca no mesmo tempo que eu,
então eu parei para deixá-la falar primeiro. Ela parou também, e então ambas sorrimos um pouco
sem jeito.
- Bella?
Não foi ela quem havia dito meu nome, por isso nós duas nos viramos para ver quem havia
se juntado a nossa pequena reunião. Na verdade, eu não precisava olhar para saber. Era uma voz
que eu teria reconhecido em qualquer lugar, e à qual eu também havia respondido, para saber se
estava dormindo ou acordada...ou até mesmo morta, eu tinha quase certeza. A voz que
atravessava o fogo – ou, com menos dramatismo, andava na lama diariamente pelo frio e a
incessante chuva.
Edward.
Embora eu sempre fosse louca para vê-lo – consciente ou não – e estava quase certa de que
se tratava de um sonho, entrei em pânico à medida que Edward se aproximava de nós,
caminhando abaixo da deslumbrante luz do sol.
Me apavorei porque vovó não sabia que eu estava apaixonada por um vampiro – ninguém
sabia – e de que forma eu iria explicar os brilhantes raios de sol quebrando-se sobre sua pele em
milhares de pedacinhos de arco-íris, como se ele fosse feito de cristal ou diamante?
Bem, vovó, só para o caso de você ter notado que meu namorado brilha. É só algo que ele
faz quando está no sol. Mas não se preocupe com isso...
O que ele estava fazendo? A única razão para que viva em Forks, é que é o lugar mais
chuvoso do mundo, ele podia sair à luz do dia sem expor o segredo de sua família. Mesmo assim,
ele estava vindo na minha direção com seu andar bem gracioso e despreocupado - com o mais
bonito sorriso em seu rosto angelical – como se eu estivesse sozinha.
Nesse momento, desejei não ser a exceção de seu misterioso dom. Em geral, agradeceria
ser a única cujos pensamentos ele não podia ouvir com a mesma clareza como se eles fossem
falados em voz alta. Mas agora eu desejei que ele pudesse me ouvir também, então assim ele
poderia escutar o aviso que eu estava gritando em minha cabeça.
Lancei um olhar apavorado para vovó, e percebi que já era muito tarde.
Nesse instante, ela apenas se virou para me olhar de volta e seus olhos tão alarmados quanto os
meus.
Edward – ainda sorrindo daquela forma tão arrebatadora que fazia com que meu coração
acelerasse e parecesse a ponto de estourar no meu peito – passou seu braço em volta de meu
ombro e virou seu rosto para minha avó.
A expressão de vovó me surpreendeu. Em vez de horrorizada, ela me olhava timidamente,
como se esperando por uma repreensão. E ela estava parada numa posição bem estranha – um
braço se separou desajeitadamente do corpo, ela o esticou e o enrolou em volta do ar. Como se
estivesse abraçando alguém que eu não podia ver, alguém invisível...
Só então, quando olhei com mais atenção, notei a enorme armação dourada que rodeava a
figura da minha avó. Sem entender nada, ergui a mão que não estava em volta da cintura de
Edward e a aproximei para tocar minha avó. Ela repetiu exatamente o mesmo movimento, como
em um espelho. Mas onde nossos dedos deveriam ter se encontrado, não existia nada além do
vidro frio...
Com uma vertiginosa sacudida, o sonho abruptamente se transformou em um pesadelo.
Não havia nenhuma avó.
Aquela era eu. Era minha imagem refletida em um espelho. Era eu, velha, enrugada e
acabada.
Edward continuava ao meu lado sem se refletir no espelho, insuportavelmente encantador
em seus eternos dezessete anos.
Ele apertou seus lábios frios e perfeitos contra minha decrépita bochecha.
- Feliz aniversário. - ele sussurrou.
Acordei assustada – meus olhos a ponto de ficarem fora de órbita – e ofegante. Uma escura
luz cinza, a familiar luz de uma manhã nublada, tomou o lugar do ofuscante sol de meu sonho.
Só um sonho, eu disse a mim mesma. Foi só um sonho. Tomei ar e saltei da cama assim que
me recuperei do susto. O pequeno calendário no canto do relógio me informou que hoje era treze
de Setembro.
Só um sonho, mas profético, sem dúvida, ao menos em um sentido. Era o dia de meu
aniversário. Acabava de fazer dezoito anos oficialmente.
Eu temi esse dia durante meses.
Durante o perfeito verão – o verão mas feliz que já tive, o mais feliz que ninguém em lugar
nenhum poderia ter, e o verão mais chuvoso da história da Península Olympic – este infeliz dia se
espreitava de tocaia, preparado para pular.
E agora que por fim havia chegado era até pior do que eu temia que seria. Eu podia sentir:
estava mais velha. Cada dia eu envelhecia um pouco mais, porém isso era diferente e
notavelmente pior. Eu tinha dezoito anos.
E Edward nunca teria.
Quando fui escovar os dentes, quase me surpreendeu que o rosto do espelho não tivesse
mudado. Olhei para mim mesma à procura de algum sinal iminente de rugas na minha pele.
Contudo, não havia outras rugas além das em minha testa, e soube que seu relaxasse, elas
desapareceriam. Eu não podia. Minhas sobrancelhas haviam se franzido formando uma linha de
preocupação acima dos meus ansiosos olhos castanhos.
Foi só um sonho, lembrei a mim mais uma vez. Só um sonho, e também o meu pior
pesadelo.
Eu dispensei o café da manhã, querendo sair de casa o mais rápido possível. Não me
encontrava com ânimo de enfrentar meu pai e ter que passar uns minutos fingindo estar feliz. Eu
honestamente tentava ficar entusiasmada com os presentes que pedi para ele não me dar, mas
sentia que estava a ponto de chorar a cada vez que deveria sorrir.
Fiz um esforço para me distrair enquanto dirigia para a escola. A visão de vovó – eu não
deveria pensar nela como se fosse eu, era difícil de tirar da cabeça. Eu não podia sentir nada além
de desespero quando entrei no familiar estacionamento que se estendia por detrás do colégio
secundário de Forks e encontrei Edward imóvel, recostado em seu lustrado Volvo prateado como
um monumento de mármore dedicado a algum esquecido deus pagão da beleza. O sonho não
fazia sentido. E ele estava esperando por mim, igual a qualquer outro dia.
O desespero desapareceu momentaneamente e a maravilha tomou seu lugar. Mesmo depois
de ter passado quase a metade do ano com ele, não podia crer que merecia tanta sorte.
Sua irmã Alice estava ao seu lado, me esperando também.
É claro que Edward e Alice não eram parentes de verdade (Em Forks, a história que ocorria
era que todos os irmãos Cullen haviam sido adotados pelo doutor Carlisle e sua esposa Esme, já
que ambos tinham uma aparência claramente bem jovem para terem filhos adolescentes), mas
suas peles tinham o mesmo tom de palidez, seus olhos na mesma estranha tonalidade de
dourado, com as mesmas olheiras arroxeadas, ressaltadas abaixo deles. O rosto de Alice, igual ao
de Edward, era surpreendentemente bonito. Aos olhos de alguém – alguém como eu – estas
semelhanças revelavam o que eles eram.
A visão de Alice me esperando ali – seus olhos de cor amarelo escuro brilhavam de
excitação, e uma pequena caixa quadrada embrulhada em papel prateado em suas mãos – me fez
franzir as sobrancelhas. Eu havia lhe dito que não queria nada, nada, nem presentes e nem
nenhum outro tipo de atenção para o meu aniversário. Evidentemente, meus pedidos foram
ignorados.
Bati a porta de minha caminhonete Chevrolet 53 – uma chuva de respingos de ferrugem
voaram até a parte externa do pneu preto. Depois caminhei lentamente para onde eles me
aguardavam. Alice veio ao meu encontro; seu rosto travesso resplandecia abaixo do pontiagudo
cabelo negro.
- Feliz aniversário, Bella!
- Shhh! – eu sibilei enquanto olhava ao redor para ter certeza de que ninguém tivesse
ouvido. A última coisa que eu queria era qualquer tipo de comemoração do triste evento.
Ela me ignorou.
- Quando quer abrir seu presente? Agora ou mais tarde? – ela me perguntou entusiasmada
enquanto caminhávamos para onde Edward nos esperava.
- Sem presentes. – protestei em um murmúrio.
Ela finalmente pareceu ser da contar de qual era meu estado de ânimo.
- Certo...mais tarde, então. Gostou do álbum de fotografias que sua mãe lhe mandou? E a
câmera fotográfica de Charlie?
Eu suspirei. É claro que ela saberia quais seriam os meus presentes. Edward não era o único
membro da sua família com habilidades fora do comum. Alice "veria" o que meus pais tivessem
planejado assim que eles tivessem decidido.
- É. Eles são ótimos.
- Eu acho que essa é uma boa idéia. Só se vive o último ano escolar uma vez. Seria bom
documentar a experiência.
- Quantas vezes você cursou o último ano?
- Isso é diferente.
Nós nos aproximamos de Edward nessa hora, e ele levantou sua mão pra mim. Eu a segurei
ansiosamente, esquecendo, por um momento, meu mal-humor. A pele dele estava, como sempre,
macia, dura, e muito fria. Ele apertou meus dedos gentilmente. Eu olhei nos seus olhos de topázio
liquido, e meu coração se apertou de forma não tão gentil. Escutando as batidas do meu coração,
ele sorriu de novo.
Ele levantou sua mão livre e traçou a ponta de um dedo gelado nos meus lábios enquanto
falava. - Então, como foi discutido, eu não estou autorizado a te desejar feliz aniversário, está
correto?
- Sim. Está correto. - Eu não podia imitar a fluência da sua articulação perfeita e formal.
Era uma coisa que só podia ter saído do início do século.
- Só checando. - Ele passou a mão pelo seu cabelo bagunçado cor de bronze. - Você podia
ter mudado de idéia. A maioria das pessoas costuma gostar de coisas como aniversários e
presentes.
Alice sorriu, o som era todo prateado, como um carrilhão passando no vento. - É claro que
você vai gostar. Todo mundo deve ser legal com você e fazer tudo do seu jeito, Bella. O que
poderia dar tão errado?
A pergunta era retórica.
- Ficar mais velha. - Eu respondi do mesmo jeito, e minha voz não era tão uniforme quanto
eu havia planejado.
Ao meu lado, o sorriso de Edward se transformou numa linha dura.
- Dezoito não é muito velha. - Alice disse. - As mulheres não costumam esperar até os trinta
e nove até ficarem tristes com os aniversários?
- É mais que Edward. - Ele suspirou.
- Tecnicamente - ela disse, mantendo o tom suave. - Porém, é só um aninho. -
E eu acho... que se eu tivesse certeza do futuro que eu queria, certeza que eu passaria a
eternidade com Edward, e Alice, e com o resto dos Cullen (preferivelmente não sendo uma
velhinha enrugada)... Então um ano ou dois não faria muita diferença pra mim. Mas Edward era
mortalmente contra qualquer futuro em que eu fosse transformada. Qualquer futuro que me
fizesse como ele - que me deixasse imortal também.
Um impasse, era assim que ele chamava.
Pra ser honesta, eu não entendia o ponto de vista de Edward.
O que é tão maravilhoso na mortalidade? Ser vampira não parecia uma coisa tão horrível,
não do jeito como os Cullen diziam, de qualquer forma.
- A que hora você vai estar lá em casa? - Alice continuou, mudando de assunto. Pela
expressão dela, ela estava planejando fazer exatamente o tipo de coisa que eu estava tentando
evitar.
- Eu não sabia que tinha planos para ir lá.
- Oh, seja boazinha, Bella - ela reclamou. - Você não vai estragar toda a nossa diversão
desse jeito, vai?
- Eu achei que o meu aniversário era sobre o que eu quisesse.
- Eu vou pegar ela com Charlie logo depois da escola - Edward disse me ignorando
completamente.
- Eu tenho que trabalhar - eu protestei.
- Na verdade, não - Alice me disse presumidamente. - Eu já falei com a Sra. Newton sobre
isso, ela vai trocar o seu horário. Ela me pediu pra dizer 'Feliz aniversário'.
- Eu, eu não posso aparecer - eu gaguejei, me atrapalhando pra encontrar uma desculpa. -
Eu, bem, eu ainda não assisti Romeu e Julieta para a aula de Inglês.
Alice bufou. - Você tem Romeu e Julieta decorado.
- Mas o Sr. Berty disse que temos que ver a atuação pra realmente apreciarmos, foi assim
que Shakespeare tencionava apresentá-lo.
Edward rolou os olhos.
- Você já assistiu o filme - Alice acusou.
- Mas não na versão dos anos sessenta. O Sr. Berty disse que é a melhor. - Finalmente Alice
perdeu o sorriso presumido e me encarou.
- Isso pode ser fácil, ou pode ser difícil, Bella, mas de um jeito ou de outro.
Edward interrompeu a ameaça dela. - Relaxe, Alice. Se Bella quer assistir o filme, então ela
pode. É o aniversário dela.
- Isso aí - eu acrescentei.
- Eu vou levar ela por volta de sete - ele continuou. - Isso vai dar mais tempo pra você
arrumar tudo.
A risada de Alice reapareceu. - Parece bom. Te vejo de noite, Bella. Vai ser divertido, você
vai ver. - Ela sorriu largamente - o grande sorriso exibiu todos os dentes brilhantes, perfeitos -
então ela me deu um beijinho na bochecha e foi dançando até a sua primeira aula antes que eu
pudesse responder alguma coisa.
- Edward, por favor - eu comecei a implorar, mas ele pressionou um dedo frio nos meus
lábios.
- Vamos discutir isso mais tarde. Nós vamos nos atrasar para a aula. - Ninguém se
incomodou em olhar pra nós enquanto sentávamos nos nossos lugares de sempre no fundo da
sala (nós tínhamos quase todas as aulas juntos agora, é incrível os favores que Edward pode
conseguir com a administração feminina da escola). Edward e eu já estamos juntos a bastante
tempo pra não sermos mais motivo de fofoca. Nem Mike Newton se incomoda em continuar me
dando aqueles olhares mal-humorados que me faziam sentir um pouco culpada. Ele sorria agora, e
eu estava feliz por ele finalmente parecer estar percebendo que nós só poderíamos ser amigos.
Mike havia mudado durante o verão - o rosto dele estava menos arredondado, fazendo as
maçãs do seu rosto mais proeminentes, e ele estava usando o seu cabelo loiro de outro jeito; ao
invés de arrepiado, ele estava mais longo e com gel pra causar um efeito casualmente bagunçado.
Era fácil ver de onde a inspiração tinha saído - mas o estilo de Edward não era uma coisa que
podia alcançada através de uma imitação. Enquanto o dia progredia, eu considerei as
possibilidades de escapar do que quer que os Cullen estivessem planejando na casa deles hoje á
noite. Já era ruim o suficiente ter que celebrar com um humor tão ruim.
Mas, o pior, isso com certeza ia envolver atenção e presentes.
Atenção nunca é uma coisa boa, qualquer outra pessoa propensa a acidentes concordaria
comigo. Ninguém quer um canhão de luz na sua direção quando você está prestes a cair de cara.
Eu muito sugestivamente pedí - bem, na verdade eu ordenei - que ninguém me desse
presentes esse ano. Parece que Renée e Charlie não foram os únicos que decidiram ignorar isso.
Eu nunca tive muito dinheiro, e isso nunca me incomodou. Renée me criou com o salário de
uma professora de jardim de infância. Charlie também não estava ficando rico com o seu trabalho
- ele era o chefe de policia dessa pequenina cidade de Forks. O meu próprio fundo pessoal vinha
dos três dias por semana que eu trabalhava numa lojinha de suplementos esportivos da cidade.
Numa cidade tão pequena, eu tinha sorte por ainda ter um emprego. Cada centavo que eu
ganhava ia direto para os meus microscópicos fundos pra faculdade. (A faculdade era só o plano
B. Eu ainda tinha esperanças no plano A, mas Edward ainda era muito teimoso em relação a me
deixar humana).
Edward tinha muito dinheiro - eu nem queria pensar no quanto.
Dinheiro significava quase nada para Edward e o restante dos Cullen.
Era só uma coisa que acabava se acumulando quando você tem tempo ilimitado nas mãos e
uma irmã que tem uma misteriosa forma de prever as mudanças da bolsa de valores. Edward não
parecia entender a minha objeção para que ele não gastasse tanto dinheiro comigo - porque eu
não me sentia confortável quando ele me levava pra um restaurente caro em Seattle, ou porque
ele não podia me comprar um carro que alcançasse uma velocidade acima de cinqueta e cinco
milhas por hora, ou porque ele não podia pagar a minha faculdade (ele estava riculamente
entusiasmado com o plano B). Edward achava que eu estava sendo desnecessáriamente difícil.
Mas como eu podia deixar que ele me desse tantas coisas quando eu não tinha nada em
troca?
Ele, por alguma razão insondável, queria estar comigo.
Qualquer coisa que ele me desse além disso, só nos deixaria ainda menos balanceados.
Enquanto o dia passava, nem Edward nem Alice falou sobre o meu aniversário de novo, e eu
comecei a relaxar um pouco.
Nós sentamos na nossa mesa de almoço de costume.
Um estranho tipo de trégua existia naquela mesa. Nós três - Edward, Alice e eu - nos
sentavamos no cantinho no sul da mesa. Agora que os mais velhos e "assustadores" (no caso de
Emmett certamente) irmãos Cullen terem se formado, Alice e Edward não pareciam tão
intimidantes, e não nos sentávamos mais sozinhos.
Meus outros amigos, Mike e Jéssica (que estavam passando pela estranha fase pós-término de
namoro na amizade), Angela e Ben (cujo relacionamento sobreviveu ao verão), Eric, Conner, Tyler
e Lauren (apesar dessa última não contar na categoria da amizade) todos nos sentávamos na
mesma mesa, no outro lado da linha invisível.
Essa linha se dissolvia nos dias de sol, quando Edward e Alice sempre faltavam a escola, e aí a
conversa se estendia sem muito esforço pra me incluir também.
Edward e Alice não achavam esse pequeno ostracismo estranho ou ferino, como eu teria achado.
Eles praticamente nem reparavam.
As pessoas sempre se sentiam estranhamente doentes de tão á vontade que ficavam perto
dos Cullen, quase com medo por alguma razão que ele não podiam explicar.
Eu era rara excessão a essa regra. Ás vezes Edward se incomodava por eu me sentir tão
confortável ao lado dele. Ele achava que era um risco á minha saúde - uma opinião que eu
rejeitava veementemente toda vez que ele tocava nela.
A tarde passou rapidamente. A aula acabou e Edward me acompanhou até a minha
caminhonete como sempre fazia. Mas dessa vez, ele segurou a porta do passageiro aberta pra
mim. Alice deve ter levado o carro dele pra casa pra que eles pudessem me impedir de fugir.
Eu cruzei meus braços e não me movi pra sair da chuva. - É meu aniversário, eu não posso
dirigir?
- Eu estou fingindo que não é seu aniversário, assim como você deseja.
- Se não é meu aniversário, então eu não preciso ir á sua casa hoje á noite...
- Tudo bem. - Ele fechou a porta do passageiro e passou por mim para ir para o lado do
motorista. - Feliz aniversário.
- Shh - eu calei ele sem muita vontade. Eu entrei pela porta aberta, esperando que ele
tivesse aceitado o outro pedido.
Edward mexia no rádio enquanto eu dirigia, balançando a cabeça em desaprovação.
- Seu rádio tem uma recepção horrível.
Eu fiz uma careta. Eu odiava quando ele mexia com a minha caminhonete.
A caminhonete era ótima, tinha personalidade.
- Você quer um som legal? Dirija o seu prórpio carro. - Eu já estava nervosa com os planos
de Alice, com o meu humor negro ainda por cima, que as palavras saíram mais afiadas do que eu
planejei. Eu mal conseguia ter um mal temperamento perto de Edward, e as minhas palavras
fizeram ele apertar os lábios pra não sorrir.
Quando eu parei na frente da casa de Charlie, ele se inclinou pra pegar meu rosto com as
duas mãos. Ele me segurou muito cuidadosamente, pressionando só a ponta dos dedos levemente
nas minhas têmporas, nas maçãs do meu rosto, minha mandíbula. Como se eu estivesse
especialmente quebrável. Que era exatamente o caso - comparado com ele, pelo menos.
- Você deveria estar de bom humor, hoje entre todos os outros dias - ele sussurrou. O doce
hálito dele varreu o meu rosto.
- E se eu não quiser estar de bom humor? - eu perguntei, minha respiração desigual.
Seus olhos dourados queimaram. - Que pena.
Minha cabeça já estava girando quando ele chegou mais pra perto e pressionou seus lábios
gelados nos meus.
Como ele pretendia, sem dúvida, eu esquecí das minhas preocupações, e me concentrei em
lembrar de inalar e exalar.
A boca dele permaneceu na minha, fria e suave e gentil, até que eu joguei meus braços no
pescoço dele e me joguei no beijo com um pouco de entusiasmo demais. Eu podia sentir os seus
lábios se curvando pra cima enquanto ele soltava meu rosto e se inclinava pra trás pra se livrar do
meu abraço.
Edward havia desenhado muitas linhas cuidadosas para o nosso relacionamento físico, com a
intenção de me manter viva.
Apesar de eu respeitar a necessidade de manter uma distância segura entre minha pele e
seus dentes afiados como navalha e cheios de veneno, eu sempre me esquecia de coisas sem
importância como essas quando ele me beijava.
- Seja boazinha, por favor - ele respirou na minha bochecha.
Ele pressionou seus lábios gentilmente nos meus mais uma vez e então se afastou, cruzando
meus braços no meu estômago.
Meu pulso estava estrondando nos meus ouvidos. Eu coloquei uma mão no meu coração. Ele
batia hiperativamente na minha palma.
- Você acha que um dia eu vou melhorar nisso? - eu imaginei, mais pra mim mesma. - Será
que um dia meu coração vai parar de querer sair do meu peito toda vez que você me toca?
- Eu realmente espero que não - ele disse, um pouco presumido.
Eu rolei meus olhos. - Vamos assistir os Capuleto e os Montague acabando uns com os
outros, certo?
- Seu pedido, minha ordem.
Edward se espalhou no sofá enquanto eu começava o filme, avançando nos créditos iniciais.
Quando eu me sentei no canto do sofá na frente dele, ele passou os braços pela minha
cintura e me puxou pro peito dele. Não era exatamente confortável como um sofá, já que o peito
dele era frio e duro - e perfeito - como uma escultura de gelo, mas era definitivamente preferível.
Ele puxou a velha manta do encosto do sofá e jogou por cima de mim pra que eu não congelasse
ao lado do corpo dele.
- Sabe, eu nunca tive muita paciência com Romeu - ele comentou enquanto o filme
começava.
- Qual é o problema com Romeu? - eu perguntei, um pouco ofendida. Romeu era um dos
meus personagens de ficção favoritos. Antes de conhecer Edward eu meio que tinha uma
quedinha por ele.
- Bem, pra começar, ele está apaixonado por essa tal de Rosaline, você não acha que isso o
torna um pouco inconstante? E depois, alguns minutos depois do casamento, ele mata o primo de
Julieta. Isso não é muito inteligente. Erro depois de erro. Será que ele poderia ter acabado com a
sua felicidade mais completamente?
Eu suspirei. - Você quer que eu assista isso sozinha?
- Não, na maior parte do tempo eu vou estar olhando você, de qualquer jeito. - Os dedos
dele traçaram linhas no meus braço, me deixando arrepiada. - Você vai chorar?
- Provavelmente - eu admití. - Se eu estiver prestando atenção.
- Então eu não vou te distrair. - Mas eu sentí os lábios dele no meu cabelo, muito distrativo.
O filme finalmente capturou meu interesse, em grande parte isso se deveu ao fato de
Edward estar citando as falas de Romeu no meu ouvido - a sua voz irresistível e aveludada fez a
voz do ator parecer fraca e rouca em comparação. E eu chorei, pra diversão dele, quando Julieta
acordou e viu seu novo marido morto.
- Eu admito, eu meio que invejo ele nessa parte. - Edward disse, enxugando as minhas
lágrimas com uma mecha de cabelo.
- Ela é muito bonita.
Ele fez um som de nojo. - Não é garota dele que eu invejo, é só a facilidade do suicídio - ele
esclareceu num tom de zombaria. - Vocês humanos morrem tão fácil! Tudo o que vocês têm que
fazer é só engolir um extrato de planta...
- Como é? - eu ofeguei.
- Foi uma coisa na qual eu tive que pensar uma vez, e eu sabia pela experiência de Carlisle
que não seria fácil. Eu nem tenho certeza de quantas vezes Carlisle tentou se matar no início...
depois que ele viu no que tinha se transformado... - A voz dele que havia ficado séria, ficou suave
de novo. - E ele claramente ainda está em perfeita saúde.
Eu me virei pra poder ler o rosto dele. - Do que é que você pensa que está falando? - eu
quis saber. - O que é que você quer dizer com, isso é uma coisa na qual eu tive que pensar uma
vez?
- Primavera passada, quando você foi... quase morta... - Ele parou pra respirar fundo,
lutando pra voltar ao seu tom de zombaria. - É claro que eu estava focado em te encontrar viva,
mas parte da minha mente estava fazendo planos contingentes. Como eu disse, não é tão fácil pra
mim quanto é pra um humano.
Por um segundo, a memória da minha viagem á Phoenix passou pela minha cabeça e me
deixou tonta. Eu podia ver tudo tão claramente - o sol que me deixava cega, as ondas de calor
que saiam do concreto enquanto eu corria enlouquecidamente pra encontra o vampiro sádico que
queria me torturar até a morte. James na sala dos espelhos com a minha mãe como refem - ou
pelo menos eu pensava. Eu não sabia que era tudo uma armação. Assim como James não sabia
que Edward estava correndo pra me salvar; Edward chegou a tempo, mas foi por bem pouco. Sem
pensar, eu passei o dedo na grande cicatriz na minha mão que estava sempre um pouco mais fria
que o resto da minha pele.
Eu balancei minha cabeça, como se isso pudesse levar pra longe todas as memórias ruins - e
tentei entender o que Edward estava dizendo. Meu estômago revirou desconfortávelmente. -
Planos contingentes? - eu repetí.
- Bem, eu não ia continuar vivendo sem você. - Ele rolou os olhos como se o fato fosse
infantilmente óbvio. - Mas eu não tinha certeza de como poderia fazer isso, eu sabia que Emmett e
Jasper nunca iam me ajudar... então eu pensei que poderia ir para a Itália e fazer alguma coisa
pra provocar os Volturi.
Eu não queria acreditar que ele estava falando sério, mas seus olhos dourados estavam
distantes, focados em algum lugar longínguo como se ele estivesse contemplando o fim da sua
vida. De repente eu estava furiosa.
- O que é Volturi? - eu quis saber.
- Os Volturi são uma família - ele explicou, seus olhos ainda distantes. - Uma família muito
velha e muito poderosa, da nossa espécie. Eles são a coisa mais próxima no nosso mundo da
família real, eu acho. Carlisle viveu brevemente com eles nos seus anos mais jovens, na Itália,
antes de se ascentar na América- você lembra da história?
- É claro que eu lembro.
Eu jamais esqueceria a primeira vez que fui a casa dele, a enorme mansão branca no meio
da floresta ao lado do rio, ou da sala onde Carlisle - Pai de Edward em muitas formas reais -
mantinha uma parede com pinturas que ilustravam a sua história pessoal. A tela mais vívida, com
as cores mais vivas de lá, a maior, era dos tempos de Carlisle na Itália. É claro que eu me
lembrava do calmo quarteto de homens, cada um com seu estranho rosto de serafim, pintados no
balcão mais alto tirando a atenção do restante das cores.
Apesar da pintura ser antiga, Carlisle - o anjo loiro - permanecia igual. E eu me lembreva dos
outros, as antigas companhias de Carlisle. Edward nunca usou o nome Volturi para o lindo trio,
dois de cabelos pretos e um branco-neve. Ele os havia chamado de Aro, Caius e Marcus, os
patronos noturnos das artes.
- De qualquer forma, você não deve irritar os Volturi - Edward continuou, interrompendo
meu revival. - Não a não ser que você queira morrer, ou o que quer que seja o que nós fazemos. -
A voz dele estava tão calma, que ele quase parecia entediado com o pensamento.
Minha raiva se transformou em horror. Eu peguei seu rosto de mármore entre minhas mãos
e segurei com muita força.
- Você não deve mais pensar nisso nunca, nunca, nunca mais! - eu disse. - Não importa o
que possa acontecer comigo, você não tem permissão pra se machucar!
- Eu nunca vou te colocar em risco de novo, então isso é inútil.
- Me colocar em risco! Eu pensei que já tínhamos estabelecido que a má sorte é minha
culpa! - eu estava ficando com mais raiva.
- Como é que você ousa pensar em uma coisa dessas? - a idéia de Edward deixando de
existir, mesmo eu estando morta, era impossivelmente dolorosa.
- O que você faria se a situação fosse contrária? - ele perguntou.
- Não é a mesma coisa.
Ele não pareceu ver a diferença. Ele gargalhou.
- E se alguma coisa acontecesse com você? - eu embranquecí com o pensamento.
- Você ia querer que eu me matasse?
Um traço de dor tocou seu rosto perfeito.
- Eu acho que entendo seu ponto de vista... um pouco - ele admitiu.
- Mas o que é que eu faria sem você? O que quer que você fazia antes de eu aparecer e
complicar a sua existância.
Ele suspirou. - Você faz parecer tão fácil.
- Devia ser. Eu não sou assim tão interessante.
Ele estava quase discutindo, mas então eu soltei o rosto dele. - Isso é inútil - ele me
lembrou. De repente ele se sentou ficando numa postura mais formal, me colocando de lado até
que não estávamos mais nos tocando.
- Charlie? - eu adivinhei.
Edward sorriu. Depois de um momento, eu ouví o som da viatura policial entrando na
garagem. Eu me inclinei e segurei a mão dele firmemente. Meu pai podia aguentar isso.
Charlie entrou com uma caixa de pizza nas mãos.
- Oi, crianças - ele sorriu pra mim. - Eu achei que você gostaria de uma folga da cozinha e
dos pratos e pelo seu aniversário. Com fome?
- Claro. Obrigada, Pai.
Charlie não comentou a aparente falta de apetite de Edward. Ele já estava acostumado em
ver Edward pulando o jantar.
- Você se incomoda se eu pegar Bella emprestada hoje á noite? - Edward perguntou quando
Charlie e eu havíamos terminado.
Eu olhei pra Charlie esperançosamente. Talvez ele tivesse algum conceito sobre aniversários
em casa, coisas de família, esse era o meu primeiro aniversário com ele, meu primeiro aniversário
desde que minha mãe, Renée, casou de novo e foi pra Flórida, por isso eu não sabia o que
esperar.
- Tudo bem, os Mariners vão jogar com os Sox hoje. - Charlie explicou e minha esperança
desapareceu. - Então eu não vou ser uma boa companhia... Aqui. - Ele levantou a câmera que me
deu por sugestão de Renée (porque eu precisaria de fotos pra encher meu livro de recordações), e
jogou pra mim.
Ele já devia saber, eu sempre tive problemas de coordenação. A câmera escorregou da
ponta dos meus dedos, e foi caindo no chão.
Edward a agarrou antes que ela se espatifasse na madeira.
- Bela pegada - Charlie reparou. - Se eles vão fazer alguma coisa divertida essa noite na casa
dos Cullen, Bella, você devia fotografar. Você sabe como sua mãe fica, ela vai querer ver as fotos
antes que você possa tirá-las.
- Boa idéia, Charlie - Edward disse, me passando a câmera.
Eu virei a câmera pra Edward, e tirei a primeira foto. - Funciona.
- Que bom. Ei, diga olá pra Alice por mim. Já faz algum tempo que ela não vem aqui - A
boca de Charlie caiu de um dos lados.
- São só três dias, pai - eu lembrei ele. Charlie estava louco por Alice. Ele se apegou na
primavera passada quando ela me ajudou na minha estranha convalescência; Charlie seria sempre
grato a ela por salvá-lo do horror de uma filha quase adulta precisando tomar banho.
- Eu digo a ela.
- OK. Divirtam-se crianças. - Obviamente estávamos sendo dispensados.
Charlie já estava indo em direção á sala e á TV.
Edward sorriu, triunfante, e pegou minha mão, me puxando pra fora da cozinha.
Quando chegamos na caminhonete, ele abriu a porta do passageiro pra mim de novo, e dessa vez
eu não discutí. Ainda era difícil encontrar o estranho retorno para a casa dele no escuro.
Edward dirigiu por Forks indo para o Norte, visivelmente vigiando o limite de velocidade
imposto pela minha Chevrolet pré-histórica.
O motor roncou ainda mais alto quando ele tentou andar a mais de cinquenta milhas.
- Vai com calma - eu avisei ele.
- Sabe o que você adoraria? Um pequeno Audi coupé. Bem quieto, muita força...
- Não há nada de errado com a minha caminhonete. E falando de coisas caras e sem
importância, se você sabe o que é bom pra você, você não gastou dinheiro com presentes de
aniversário.
- Nem um centavo - ele disse virtuosamente.
- Bom.
- Você pode me fazer um favor?
- Depende do que é.
Ele suspirou. Seu adorável rosto estava sério. - Bella, o último aniversário de verdade que
um de nós teve foi Emmett em 1935. Poupe-nos um pouco, e não seja tão difícil essa noite. Eles
estão todos muito excitados.
Sempre me surpreendia quando ele falava dessas coisas. - Tá certo, eu vou me comportar.
- Eu provavelmente devo te avisar...
- Por favor avise.
- Quando eu digo que estão todos excitados... eu quero dizer todos eles.
- Todo mundo? - eu asfixiei. - Eu pensei que Emmett e Rosalie estivessem na Africa. O resto
de Forks achava que os Cullen mais velhos haviam ido para a faculdade, em Dartmouth, mas eu
sabia a verdade.
- Emmett queria estar aqui.
- Mas... Rosalie?
- Eu sei, Bella. Mas não se preocupe, ela vai se comportar bem.
Eu não respondi. Como se eu não fosse me preocupar, assim tão fácil. Diferente de Alice, a
outra irmã "adotiva" de Edward, a loira e notável Rosalie, não gostava muito de mim. Na verdade,
o sentimento era um pouco mais forte que isso. Quando se tratava de Rosalie, eu era uma intrusa
que sabia o segredo da família.
Eu me sentia horrivelmente culpada pela presente situação, achando que a ausência de
Emmet e Rosalie fosse por minha culpa, mesmo não gostando muito de ver ela, de Emmett, o
irmão urso de Edward, eu sentia falta. Ele era de muitas formas, o irmão mais velho que eu
sempre quis ter... só que era muito, muito mais aterrorizante.
Edward decidiu mudar de assunto. - Então, se você não quer me deixar te comprar um Audi,
tem alguma coisa que você queira de aniversário?
As palavras saíram num sopro. - Eu sei o que eu quero.
Uma profunda carranca fez linhas na testa dele. Ele obviamente preferia ter ficado no
assunto de Rosalie.
Eu sentia que havíamos tido muito essa discussão hoje.
- Hoje não, Bella, por favor.
- Bem, talvez Alice me dê o que eu quero.
Edward rosnou - um som profundo de ameaça. - Esse não vai ser o seu último aniversário,
Bella - ele prometeu.
- Isso não é justo!
Eu achei ter ouvido seus dentes se cerrando.
Nós estávamos parando na frente da casa dele agora. Luzes claras brilhavam de todas as
janelas nos dois primeiros andares. Uma longa fila de lanternas Japonesas estava pendurada nos
arcos do portal da entrada, refletindo um leve brilho que vinha das enormes árvores que cercavam
a casa. Grandes vasos de flores - rosas cor de rosa - enchiam a larga escadaria que levava até a
porta.
Eu gemí.
Edward respirou fundo algumas vezes pra se acalmar também.
- Isso é uma festa - ele me lembrou. - Tente se divertir.
- Claro - eu murmurei.
Ele deu a volta para abrir minha porta, e me ofereceu sua mão.
- Eu tenho uma pergunta.
Ele esperou cautelosamente.
- Se eu revelar esse filme - eu disse, brincando com a câmera nas mãos - Você vai aparecer
nas fotos?
Edward começou a rir. Ele me ajudou a sair do carro, me levou pelas escadas, e ainda
estava rindo quando abriu a porta pra mim.
Eles estavam todos esperando na enorme sala de estar branca; quando eu entrei pela porta
eles me receberam com um enorme coro de "Feliz aniversário, Bella!” enquanto eu corava e
olhava pra baixo. Alice, eu acho, tinha cobrido todas as superfícies planas com velas cor de rosa e
dezenas de vasos de cristal com centenas de rosas. Havia uma mesa coberta com uma toalha
branca ao lado do grande piano de Edward, haviam um grande bolo cor de rosa sobre ela, mais
rosas, uma pilha de pratos de vidro, e uma pequena pilha de presentes cobertos com papel
prateado.
Era cem vezes pior do que eu havia imaginado.
Edward, sentindo meu estresse, passou uma braço encorajador pela minha cintura e deu um
beijo no topo da minha cabeça.
Os pais de Edward, Carlisle e Esme, impossívelmente jovens e amáveis como sempre, eram
os mais próximos da porta. Esme me abraçou cuidadosamente, seu cabelo macio, cor de caramelo
alisando minha bochecha quando ela deu um beijo na minha testa, e então Carlisle colocou seu
braço ao redor dos meus ombros.
- Desculpe por isso, Bella - ele meio que sussurrou. - Nós não pudemos deter Alice.
Rosalie e Emmett estavam atrás deles. Rosalie não sorriu, mas pelo menos não me encarou.
O rosto de Emmett estava envolvido num enorme sorriso. Já faziam meses que eu não os via; eu
tinha esquecido do quanto Rosalie era bonita - quase doía olhar pra ela. E Emmett sempre foi
tão... grande?
- Você não mudou nada - Emmett disse com falso desapontamento. - Eu esperava ver uma
diferença notável, mas aqui está você, com o rosto vermelho como sempre.
- Muito obrigada, Emmett - eu disse, ficando mais vermelha ainda.
Ele sorriu. - Eu tenho que sair rapidinho - ele piscou eminentemente pra Alice. - Não faça
nada engraçado até eu voltar.
- Eu vou tentar.
Alice soltou a mão de Jasper e se aproximou... todos os seus dentes brilhando na luz clara.
Jasper sorria também, mas continuou distante. Ele se encostou, alto e loiro, no pilar no início da
escadas.
- Durante os dias que havíamos passado juntos em Phoenix, eu achava que ele havia lidado
com a sua aversão á mim. Mas ele voltou a ser como sempre - me evitando o máximo possível -
no exato momento que se livrou da obrigação temporária de me proteger.
Eu sabia que não era pessoal, só precaução, e eu tentei não ser sensível demais em relação
á isso. Jasper que tinha mais problemas na convivência com os Cullen por causa da dieta do que
os outros; o cheiro do sangue humano era muito mais difícil pra ele resistir do que pros outros -
ele não estava tentando a tanto tempo.
- Hora de abrir os presentes - Alice declarou. Ela colocou sua mão gelada no meu cotovelo e
me guiou até a mesa com o bolo e os pacotes brilhantes.
Eu fiz minha melhor cara de mártir.
- Alice, eu sei que te disse que não queria nada.
- Mas eu não te ouví - ela me interrompeu, presumida. - Abra. - Ela pegou a câmera das
minhas mãos e a trocou por uma caixa enorme e prateada.
A caixa estava tão leve que parecia vazia. A etiqueta em cima dizia que era de Emmett,
Rosalie e Jasper. Envergonhada, eu rasguei o papel e olhei pra ver o que a caixa escondia.
Era algo elétrico, com um monte de números no nome. Eu abrí a caixa, esperando por uma
iluminação maior. Mas a caixa estava vazia.
- Um... Obrigada.
Rosalie realmente sorriu. Jasper gargalhou. - É um som para a sua caminhonete - ele
explicou. - Emmett está instalando agora mesmo pra que você não possa devolver.
Alice como sempre estava um passo á minha frente.
- Obrigada, Jasper, Rosalie - eu disse sorrindo, enquanto lembrava das reclamações de
Edward sobre o meu rádio esta tarde - tudo armação, aparentemente. - Obrigada, Emmett! - eu
disse mais alto.
Eu ouví a risada expansíva dele na minha caminhonete, e não pude evitar de rir também.
- Agora abra o meu e o de Edward - Alice disse, ela estava tão excitada que sua voz era só
um ruído alto de alegria. Ela segurou um quadrado achatado nas mãos.
Eu me virei pra encarar Edward. - Você prometeu.
Antes que ele pudesse responder, Emmett entrou por adentro. - Bem na hora! - ele disse
alegremente. Ele se empurrou atrás de Jasper, que também tinha chegado mais perto que de
costume pra dar uma boa olhada.
- Eu não gastei um centavo - Edward me assegurou. Ele tirou uma mecha de cabelo do meu
rosto, deixando minha pele com cócegas pelo seu toque.
Eu inalei profundamente e olhei pra Alice. - Dê pra mim. - Eu suspirei.
Emmett gargalhou deliciado.
Eu peguei o pequeno pacote, rolando meus olhos pra Edward enquanto colocava meu dedo
na boda do papel e o puxava por baixo da fita.
- Droga - eu murmurei quando o papel cortou meu dedo; eu o puxei pra examinar o estrago.
Uma pequena gota de sangue saia do pequeno corte.
Depois disso tudo aconteceu muito rápido.
- Não! - Edward rugiu.
Ele se jogou por cima de mim, me jogando por cima da mesa. Ela caiu, assim como eu,
derrubando o bolo, os presentes, as flores e os pratos. Tudo caiu numa bagunça de cristais
quebrados. Jasper se chocou contra Edward, e o som pareceu com o de um deslizamento de
pedras.
Houve outro barulho, um terrível rosnado que parecia ter saído de dentro do peito de Jasper.
Jasper tentou passar por Edward, mostrando seus dentes a apenas alguns centímetros do
rosto de Edward.
Emmett pegou Jasper por trás no outro segundo, prendendo ele no seu volumoso aperto de
aço, mas Jasper lutou com ele, seus olhos, selvagens, vazios, só se focavam em mim.
Depois do choque só ficou a dor. Eu caí no chão ao lado do piano, com meus braços jogados
pra trás instintivamente pra aparar a minha queda, jogando-os nos cacos de vidro quebrado.
Só agora eu sentia a dor queimando, pulsante, que corria desde o meu pulso até a dobra do
meu cotovelo.
Confusa e desorientada, eu olhei pra cima por causa do sangue pulsante que saía do meu
braço - e olhei para os olhos de seis vampiros repentinamente vorazes.
2. SUTURA
Carlisle foi o único que permaneceu calmo. Séculos de experiência nas salas de emrgência
ficavam evidentes na sua voz calma, autoritária.
- Emmett, Rose, tirem Jasper daqui.
Sem sorrir pela primeira vez, Emmett balançou a cabeça. - Vamos lá, Jasper.
Jasper lutou contra o aperto inquebrável de Emmett, se remexendo, avançando na direção
do irmão com os dentes á amostra, os olhos ainda estavam sem razão.
O rosto de Edward estava mais branco que papel quando ele se arrastou pra se curvar sobre
mim, numa postura claramente defensiva.
Um rugido baixo de aviso escapou por entre seus dentes trincados.
Eu podia perceber que ele não estava respirando.
Rosalie, se divino rosto estranhamente presumido, ficou na frente de Jasper- mantendo uma
cuidadosa distância dos seus dentes - e ajudou Emmett a levar ele pra fora pela porta de vidro
que Esme segurou aberta, com uma mão tapando a boca e o nariz.
O rosto com formato de coração de Esme estava envergonhado. - Eu sinto muito, Bella - ela
lamentou enquanto seguia os outros até o jardim.
- Me deixe passar, Edward - Carlisle murmurou.
Um segundo se passou, e então Edward balançou a cabeça lentamente e relaxou de sua
posição.
Carlisle se ajoelhou á meu lado, se inclinando mais pra perto pra examinar meu braço. Eu
podia sentir o choque congelado no meu rosto e tentei me recompor.
- Aqui, Carlisle - Alice disse o entregando uma toalha.
Ele balançou a cabeça. - Tem muito vidro na ferida. - Ele se aproximou e arrancou uma tira
longa e fina da toalha que cobria a mesa. Ele torceu a tira no meu braço logo acima do cotovelo
como um torniquete. O cheiro do sangue estava me deixando tonta. Meus ouvidos zumbiam.
- Bella - Carlisle disse levemente. - Você quer que eu te leve até o hospital, ou você prefere
que eu cuide disso aqui.
- Aqui, por favor - eu sussurrei. Se ele me levasse pra o hospital, não ia ter jeito de esconder
de Charlie.
- Eu vou pegar sua maleta - Alice disse.
- Vamos levá-la para a mesa da cozinha - Carlisle disse pra Edward.
Edward me levantou sem esforço enquanto, Carlisle mantinha a pressão firme no meu braço.
- Como você está, Bella? - Carlisle me perguntou.
- Eu estou bem - minha voz estava razoavelmente firme, o que me deixou contente.
O rosto de Edward parecia pedra.
Alice estava lá. A maleta de Carlisle já estava sobre a mesa, uma mesa pequena mas
brilhante com uma luz plugada na parede. Edward me sentou gentilmente na cadeira, e Carlisle
puxou outra. Ele começou a trabalhar imediatamente.
Edward ficou ao meu lado, ainda me protegendo, ainda sem respirar.
- Vai, Edward - eu suspirei.
- Eu aguento - ele insistiu. Mas a mandíbula dele estava rígida; seus olhos queimavam com a
intencidade da sede que ele sentia que ele lutava, que era muito pior pra ele que para os outros.
- Você não precisa ser um herói - eu disse. - Carlisle pode cuidar de mim sem sua ajuda. Vá
tomar um ar fresco.
Eu gemí quando Carlisle fez alguma coisa no meu braço que doeu como uma picada.
- Eu fico - ele disse.
- Porque você é tão masoquista? - eu murmurei.
Carlisle decidiu interceder. - Edward, você deve encontrar Jasper antes que ele vá longe
demais, e eu duvido que ele vá ouvir alguém que não seja você agora.
- Sim - eu disse ansiosamente. - Vá encontrar Jasper.
- Você deve fazer alguma coisa útil - Alice acrescentou.
Os olhos de Edward se estreitaram enquanto nós o atacávamos em grupo, mas, finalmente,
ele balançou a cabeça uma vez e saiu suavemente pela porta de trás da cozinha. Eu tinha certeza
de que ele não havia respirado desde o momento que eu cortei o dedo.
Uma sensação entorpecida, morta, estava se espalhando pelo meu braço.
Apesar disso acabar com a dor, me lembrou do corte, e eu observei cuidadosamente o rosto
de Carlisle pra me distrair do que ele estava fazendo no meu braço. O seu cabelo irradiava
dourado na luz brilhante enquanto ele se inclinava sobre o meu braço. Eu podia sentir as leves
sensações de incomodo, mas eu estava determinada a não deixar as minhas fraquezas tomarem
conta de mim.
Não havia dor agora, só uns puxõezinhos, que eu estava tentando ignorar. Não era motivo
pra ficar enjoada como um bebê.
Se ela não estivesse na minha linha de visão, eu nem teria visto Alice desistir e sair da
cozinha. Com um pequeno sorriso que pedia desculpas nos lábios, ela desapareceu pela porta da
cozinha.
- Bom, já foram todos - eu suspirei. - Eu posso limpar uma sala, pelo menos.
- Não é culpa sua - Carlisle me confortou com uma risada. - Poderia acontecer com qualquer
um.
- Poderia - eu repetí. - Mas geralmente só acontece comigo.
Ele riu de novo.
Sua calma relaxada era ainda mais incrível em contraste com a reação dos outros. Eu não
conseguí achar nem um traço de ansiedade nos olhos dele. Ele trabalhava com movimentos
rápidos, certeiros.
O único som além das nossas respirações calmas era o som do plink, plink enquanto os
pequenos fragmentos de vidro caíam um a um na mesa.
- Como é que você consegue fazer isso? - eu quis saber. - Até Alice e Esme... - eu parei,
balançando minha cabeça em dúvida. Apesar do resto da família também ter desistido da
tradicional dieta dos vampiros tão absolutamente quanto Carlisle, ele era o único que podia sentir
o cheiro de sangue sem sofrer com a intensa tentação. Claramente, isso era muito mais difícil do
que ele queria fazer parecer.
- Anos e anos de prática - ele me disse. - Eu quase não sinto mais o cheiro.
- Você acha que seria mais difícil se você tirasse umas longas férias do hospital, e não
houvesse nenhum sangue por perto?
- Talvez - ele levantou os ombros, mas suas mãos continuaram firmes. - Eu nunca sentí
necessidade de longas férias. - Ele mostrou um grande sorriso brilhante na minha direção. - Eu
gosto muito do meu trabalho.
Plink, plink, plink.. Eu estava surpresa de ver quanto vidro parecia ter no meu braço. Eu
estava tentada em olhar para a pilha crescendo, só pra checar o tamanho, mas eu sabia que a
idéia não seria de grande ajuda para a minha estratégia de não vomitar.
- Do que é que você gosta? - eu imaginei.
Pra mim não fazia sentido - os anos de luta e negação que ele deve ter passado até alcansar
o ponto que ele conseguiria lidar com isso tão facilmente. Além do mais, eu queria manter ele
falando; a conversa mantinha minha cabeça longe da sensação de enjôo do meu estômago.
Seus olhos escuros estavam calmos e pensativos enquanto ele falava.
- Hmm. O que eu gosto mais é quando minhas... habilidades adquiridas me deixam salvar
uma pessoa que poderia estar perdida. É bom saber que, graças ao que eu faço, a vida de
algumas pessoas é melhor porque eu existo. Até o cheiro do sangue é uma ferramenta que me
ajuda as vezes. - Um dos lados da boca dele se levantou num meio sorriso.
Eu pensei nisso enquanto ele me cutucava, pra ter certeza que todos os cacos do meu braço
haviam saído. Então ele procurou na sua maleta por outras ferramentas, e eu tentei não reparar
na agulha e na linha.
- Você dá muito duro pra tentar se redimir de uma coisa que nunca foi culpa sua - eu sugerí
enquanto outro tipo de picada começou a puxar os cantos da minha pele. - O que eu quero dizer
é, você não pediu por isso. Você não escolheu esse tipo de vida, e mesmo assim você tem que
trabalhar tão duro pra ser bom.
- Eu não acho que esteja me redimindo por nada - ele discordou suavemente. - Como tudo
na vida, eu só tive que escolher o que fazer com o que me foi dado.
- Isso faz tudo parecer fácil.
Ele examinou meu braço de novo. – Aí - ele disse, cortando a linha. - Tudo pronto. - Ele
pegou uma gaze grande, molhando-a com uma espécie de xarope colorido, e a colocou ao redor
da saturação.
O cheiro era estranho; fez minha cabeça rodar. O xarope queimou minha pele.
No começo, porém eu pressionei enquanto ele amarrava outro pedaço de gaze seguramente
no lugar, lacrando ela no meu braço. - Porque é que você sequer pensou em viver de outra
maneira que não da maneira mais óbvia?
Seus lábios se ergueram num sorriso privado. - Edward já não te contou essa história?
- Sim. Mas eu estou tentando entender o que você estava pensando...
Seu rosto estava repentinamente sério de novo, e eu me perguntei se os pensamentos dele
teriam ido para o mesmo lugar que os meus. Imaginando em que eu estaria pensando quando -
eu me recusava a pensar em um se - fosse eu.
- Você sabe que meu pai era um clérigo. - ele meditou enquanto limpava cuidadosamente a
mesa, esfregando tudo com uma gaze molhada, e depois fazendo tudo de novo. O cheiro de alcool
queimou no meu nariz. - Ele tinha uma visão muito dura do mundo, que eu já estava começando a
questionar quando eu fui mudado.
Carlisle pôs a gaze suja e os pedaços de vidro dentro de um vaso de cristal vazio.
Eu não entendí o que ele estava fazendo, mesmo quando ele acendou o fósforo. Então ele o jogou
nas fibras encharcadas de álcool, e a explosão me fez pular.
- Desculpe - ele se desculpou. - Isso vai dar conta... Então eu não concordava com o ponto
de vista do meu pai sobre fé particularmente. Mas nunca, nesses quase quatrocentos anos desde
que eu nascí , eu ví alguma coisa que me fizesse duvidar da existência de Deus, de uma forma ou
de outra. Nem mesmo a reflexão do espelho.
Eu fingí examinar o curativo no meu braço pra esconder a minha surpresa com o curso que a
nossa conversa havia tomado. Religião era a única coisa que eu não esperava, de todas as coisas
que eu considerei. Minha própria vida era muito destituída de crenças.
Charlie se considerava um Luterano, porque os seus pais haviam sido, mas durante os
Domingos ele só rezava se fosse na beira do rio com uma vara de pesca na mão. Renée havia
tentado a igreja de vez em quando, mas, assim como os seus casos com o Tênis, as aulas de
cerâmica, Ioga e de Francês, ela resolvia desistir quando ficava sabendo de outra novidade.
- Eu sei que tudo isso parece bizarro, especialmente vindo de um vampiro. - Ele sorria,
sabendo que o uso da palavra sempre acabava me chocando. - Mas eu espero que haja um
sentido nessa vida, mesmo pra nós. É um longo período, eu admito - ele continuou num tom
desinteressado. - De todas as formas, estamos decididamente amaldiçoados. Mas eu espero,
talvez inutilmente, que nós ganhemos alguma espécie de crédito por tentar.
- Eu não acho que isso é inútil - eu murmurei. Eu não conseguia imaginar, todo mundo
incluído, alguém que não ficasse impressionado com Carlisle. Além do mais, o único tipo de
paraíso que eu iria apreciar tinha que incluir Edward. - Eu não acho que as outras pessoas
achariam também.
- Na verdade, você é a primeira a concordar comigo.
- Os outros não acham o mesmo? - eu perguntei, surpresa, pensando em uma pessoa em
particular.
Carlisle adivinhou a direção dos meus pensamentos de novo.
- Edward concorda comigo em um ponto. Deus e o paraíso existem... e o inferno também.
Mas ele não acredita em uma outra vida pra o nosso tipo. - Carlisle falava com uma voz muito
suave; ele olhava pela grande janela em cima da pia, olhando para a escuridão. - Entenda, ele
acha que somos almas perdidas.
Imediatamente eu pensei nas palavras de Edward nessa tarde: a não ser que você queira
morrer - ou o que quer que seja que nós fazemos. Uma pequena lâmpada estalou na minha
cabeça.
- Esse é o problema real, não é? - eu adivinhei. - É por isso que ele está sendo tão difícil em
relação a mim.
Carlisle falou vagarosamente. - Eu olho para o meu... filho. Sua força, sua bondade, seu
brilho que esplandece por fora dele - e isso só enche aquela esperança, aquela fé, mais do que
nunca. Como poderia não haver algo mais para alguém como Edward?
Eu afirmei com a cabeça, concordando fervorosamente.
- Mas se eu acreditasse no que ele acredita... - ele olhou pra baixo pra mim com olhos
insondáveis. - Se você acreditasse no que ele acredita. Você poderia tirar a alma dele?
O jeito como ele colocou a frase obstruíu minha resposta.
Se ele tivesse me perguntado se eu arriscaria minha alma por Edward, a resposta seria
óbvia. Mas será que eu poderia arriscar a alma de Edward? Eu torcí meus lábios infeliz. Isso não
era muito justo.
- Você vê o problema.
Eu balancei minha cabeça, consciente da posição teimosa do meu queixo.
Carlisle suspirou.
- É minha escolha - eu insistí.
- E dele também. - Ele levantou a mão quando viu que eu estava disposta a discutir. - Ele
será responsável por fazer isso com você.
- Ele não é o único que pode fazer isso - eu olhei pra Carlisle sugestivamente.
Ele riu, abruptamente suavizando o humor. - Oh, não! Você vai ter que acertar isso com ele -
Mas então ele suspirou. - É dessa parte que eu nunca tenho certeza. Eu acho, na maioria das
maneiras, que eu fiz o melhor com o que eu tinha. Mas será que foi certo impor os outros a esse
tipo de vida? Eu não consigo decidir.
Eu não respondí. Eu imaginei como minha vida seria se Carlisle tivesse resistido a tentação
de viver um vida menos solitária... e tremí.
- Foi a mãe de Edward que fez minha cabeça.
A voz de Carlisle era quase um suspiro. Ele olhou pelas janelas escuras sem ver nada.
- A mãe dele? - Toda vez que eu tentava falar com Edward sobre os seus pais, ele só dizia
que eles haviam morrido há muito tempo e que as lembranças dele eram vagas. Eu me dei conta
de que as memórias de Carlisle, apesar da brevidade do contato deles, seriam perfeitamente
claras.